DEVANEIOS - 01


Não fôssemos tão sóis, quem sabe compreendêssemos o teu espanto ao ouvir-me falar dessa saudade que bate em mim - e eu muito apanho e como dói - ao recordar aqueles dias que eram tão nossos, amanhecidos entre poemas sem rimas e sem métrica. Onde o melhor da poética era ninarmos entardeceres enquanto acompanhávamos lentamente um rastro negro e virgem cobrindo o céu. As noites infindáveis escorriam mansamente entre diálogos silentes enquanto carícias mais que ternas mantinham a madrugada acordada por mais tempo. Mas...Tudo fora abreviado por um grave vento num dos melhores momentos. Talvez por isso, a nuvem da incerteza paire nos arredores da tua razão, confundindo-te, quem sabe, por um tempo a mais, motivada pelos meus sinais. Atrevida que sou, direi ainda que esses sinais provocaram um estranho marolar bem no meio do teu peito e, se ainda te conheço, adivinho tua face corada, levemente inclinada para o lado esquerdo. Se assim for, direi que não estás sozinho nesse oceano transbordante de vontades. Mas...Suposições, apenas. Certo em tudo isso é que um grito contundente ecoou no mais profundo dessas noites insones trazendo a lembrança de tuas palavras boiando pelos ares do meu quarto. E foram elas... Sim, foram elas que acordaram esses dias de ausências tantas, permitindo-me chegar até aqui, quase vento, quase brisa, sussurrando lentamente: não fôssemos tão sóis...

- Lena Ferreira - (in Devaneios - 01)

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